Estamos assustados com a notícia da morte de mais da metade do Rio Paraopeba, um dos principais afluentes do Rio São Francisco. O rompimento da barragem de rejeitos da Vale, situada na zona rural de Brumadinho – MG, foi mais um crime ambiental devastador. Foram liberadas 14 toneladas de rejeitos de minério de ferro e, desde então, vem tirando vidas e a esperança do povo ribeirinho e o sono do povo daqui do Vale do São Francisco.
Durante um trabalho de campo nas ilhas do Rio São Francisco, aqui no Vale, alguns questionamentos do povo ribeirinho me despertaram a necessidade de simplificar informações sobre o caso e os riscos envolvidos.

Com base no relatório da SOS Mata Atlântica, que foi publicado no dia 27/02, vou tentar simplificar os principais termos que interferem diretamente na vida dos beiradeiros do Velho Chico e que costumam gerar dúvidas.
Primeiro, o que são os rejeitos de minério de ferro que mataram maior parte do rio Paraopeba?
⁃ Para fabricar carros, eletrodomésticos e até na construção civil, um dos materiais mais usados é o aço. A matéria prima do aço é o minério de ferro, que é extraído das rochas com água e o material sem valor dessa extração é armazenado, em forma de lama, em barragens. Está aí o tal rejeito.
O que sabemos é que essa lama, que devastou mais de 300km do Rio Paraopeba, corre em direção do Rio São Francisco. A SOS Mata Atlântica coletou e analisou a qualidade da água em 22 pontos do Rio Paraopeba: 10 apresentaram situação RUIM e em 12 pontos a situação é PÉSSIMA!

Mas essa lama vai chegar aqui no Vale do São Francisco?
⁃ Não com a mesma apresentação do Rio Paraopeba.
Porque?
⁃ Antes de chegar ao Rio São Francisco, a lama vem perdendo força e se depositando no fundo do rio Paraopeba, a lama perde velocidade nos remansos por causa das muitas curvas do Rio.
⁃ Outro motivo da redução da força são as barragens da termelétrica de Ibirité e a barragem de Retiro Baixo, que conseguiram reter mais rejeitos.
Então, não corremos riscos por aqui?
⁃ Sim, apesar de não ver a lama passando por aqui, a contaminação por metais pesados em níveis altos será devastadora e em níveis baixos matará aos poucos.
Para a segurança do meio ambiente, existe uma Resolução Federal (CONAMA 357) que determina limites aceitáveis de contaminação nos rios para determinados usos. Com base nesses limites, vamos destacar o que a Vale mandou para o Vale.
Todas as áreas monitoradas apresentaram condições de água impróprias para consumo humano, irrigação de plantações e matar a sede dos animais, devido às concentrações de metais pesados bem acima do nível permitido por lei.
O que “diachus” é metal pesado?
⁃ De acordo com alguns autores, qualquer metal pode ser considerado pesado. Afinal, o adjetivo pesado literalmente quer dizer que são materiais mais densos, um metal pesado não pode ser sintetizado ou destruído pela ação do homem.
⁃ Os principais responsáveis por poluição de metais pesados no solo e águas são empresas mineradoras, indústrias de produtos eletrônicos e produtos como: tintas, pilhas, fertilizantes, pesticidas…

Quais os riscos da contaminação por metal pesado?
Um dos riscos é com o contato direto com o organismo, esses metais acabam atraindo para si dois elementos essenciais do corpo: proteínas e enzimas. Eles se unem a algumas delas, impedindo que funcionem – o que pode levar até à morte. Os metais pesados também se ligam às paredes celulares, dificultando o transporte de nutrientes.
Segundo o relatório, os principais metais encontrados em limites perigosos e nocivos à saúde foram:
⁃ Cobre: O organismo também tem necessidade de pequenas quantidades como é o caso do cobre, que nos ajuda a absorver vitamina C. Em concentrações altas, porém, ele é tóxico. A concentração máxima permitida de cobre no Rio é de 0,009 miligrama por litro, e em alguns pontos do Rio foram encontrados 4 miligramas por litro. O consumo de quantidades relativamente pequenas de cobre livre pode provocar náuseas e vômitos, imagina o consumo 400 vezes superior ao permitido?
⁃ Manganês: o limite aceitável é de 0,1 miligramas por litro e chegou a até 3 mg/L em alguns locais. Existe o risco de seres humanos apresentarem sintomas como rigidez muscular, tremores das mãos e fraqueza a partir da ingestão de manganês.
⁃ Ferro: esteve acima de 6 miligramas por litro e, junto ao manganês, é responsável pela coloração avermelhada no Rio.
O relatório aponta elevadas taxas de turbidez (uma propriedade física que quer dizer a redução da transparência da água), metais pesados, bactérias e baixa oxigenação da água na maioria dos pontos analisados. Desta maneira, o Rio perde toda a sua função de abastecimento público e qualquer uso da água.

Afinal, onde está a lama neste momento?
Segundo Malu Ribeiro, coordenadora da pesquisa, a lama já chegou à barragem de Três Marias no Rio São Francisco. Eu considero esse não só o maior crime ambiental do Brasil, mas do mundo! Por comprometer o Rio da Integração Nacional, é inaceitável qualquer tipo de contaminação que venha colocar em risco a agricultura, pesca, lazer, economia e principalmente abastecimento humano.
Porém, segundo a Agência Nacional de Águas – ANA, os dados mais recentes, do dia 24/02, não indicam alteração significativa na qualidade da água depois da barragem de Retiro Baixo. Isso não tranquiliza a situação, afinal, com as chuvas, o rejeito retido nas barragens pode descer em maior concentração para o nosso Velho Chico.
São gerações comprometidas, vidas humanas ceifadas e em risco, fauna e flora com perdas imensuráveis, ocasionando um desequilíbrio ecológico em todo ambiente que já vem sofrendo há muito tempo. De fato, nossos corpos hídricos já vinham acometidos de um câncer causado pela ganância humana, dilacerando todo ciclo hidrológico, e agora em metástase espalhando por todo o Brasil. Estamos assistindo a morte à míngua de nossos principais rios. A Vale para o Vale – e para o mundo – não vale nada!
João Batista, 76 anos – Beradeiro.
João Batista, 76 anos – Beradeiro.