Essa foto me faz recordar as viagens durante minha infância. Costumávamos sair Campo Formoso, interior da Bahia, para a capital baiana em diferentes épocas do ano: a passeio, para o médico ou visitar familiares.
Durante as viagens, além da paisagem estonteante, me chamava atenção como ficava o para-brisa do carro todo pintado por borboletas e insetos que eram atingidos na estrada. Adorava ouvir a fita K7 do Edson Gomes, era a combinação perfeita para ir curtindo as diferenças das paisagens na estrada.
Recentemente peguei novamente a mesma estrada, comecei a refletir enquanto olhava profundamente o horizonte através da janela do ônibus. E, em meio a nostalgia, me veio uma preocupação. Junto com a saudade daquele tempo bom, das brincadeiras, velhos amigos, a constatação da ausência das borboletas no para-brisa. Infelizmente, isso é cena rara nos tempos de hoje e me fez pensar durante todo o trajeto. Enquanto ouvia minha playlist no fone de ouvido, pensava no quanto é assustador as transformações nas paisagens. Em 1996, tinha uma riqueza de variedade na vegetação nativa, era comum avistar livremente, ou até alguns acidentes com animais silvestres. Estas mudanças talvez já sejam consequência da falta de insetos, a flora nativa não existe sem polinização, e sem a flora os animais migram em busca de sobrevivência. Tudo isso se transformando e passando bem na nossa frente e, apesar de tão próximo, às vezes passa despercebido.
Na correria do dia a dia, fica difícil notar alterações na quantidade desses “bichinhos” tão pequenos, às vezes até inoportunos. Isso parece nos ofuscar do desastre ambiental que vivemos. Apesar do tamanho pequeno, os insetos tem uma grande importância para o equilíbrio ecológico no planeta. Albert Einstein (morto há mais de 60 anos) já tratava com profundidade e preocupação o tema: “Se as abelhas desaparecerem da face da terra, a humanidade terá apenas mais quatro anos de existência. Sem abelhas não há polinização, não há reprodução da flora, sem flora não há animais, sem animais não haverá raça humana”
Hoje, infelizmente, as crianças não conhecem a alegria de cantar com os amigos: “Cai, cai, tanajura na panela da gordura”. A brincadeira era correr atrás das tanajuras com um saco para captura-las, logo depois tirávamos o ferrão e ia pra panela. De verdade, era mais gostoso que pipoca “copa do mundo”. Lamentavelmente, as tanajuras (formigas gigantes) que anunciavam o período chuvoso e a fartura na agricultura são quase impossíveis de se ver hoje na região.
Uma passada rápida nos noticiários e logo ouvimos que o mundo vai entrar em um colapso, perdemos 60% dos animais silvestres e as abelhas estão desaparecendo. Não são projeções, são a realidade! O avanço da agricultura e uso indiscriminado de agrotóxicos está dizimando também os insetos. Transformando nosso presente e colocando em dúvida nosso futuro.
É preocupante saber que estamos trilhando friamente para o fim dos recursos naturais, guiados por pessoas, leis e hábitos que vão contra a sustentabilidade no planeta. O Brasil lidera o ranking mundial do uso de agrotóxicos, o EUA este ano, saiu do acordo de Paris. E histórias como a minha estão ficando apenas nas memórias de uma geração, que sofre e vai sofrer muito mais com as mudanças climáticas. Porém, é a única geração capaz de transformar o rumo desta história triste.
Quando me dei conta, estava em 2018, e tinha chegado ao meu destino. A viagem foi rápida, mas o suficiente para notar o que passou despercebido por mim há 22 anos. Talvez as manchas de borboletas no para-brisa que via na infância foram apagadas para sempre, mas não da minha memória.
O momento que estamos vivendo é desastroso, precisamos de mudanças, e para começar podemos fazer a nossa parte com novos hábitos, sobretudo para a conservação do meio ambiente. Só assim para que nossas crianças possam contemplar a biodiversidade, ver, cheirar, tocar e sentir. Pois, estas sensações não existe tecnologia no mundo capaz de proporcionar!
